15 de agosto de 2009

A RELIGIÃO

"Os homens desprezam a religião; odeiam-na e temem que seja verdadeira. Para acalmá-los, é preciso começar mostrando que a religião não é contrária à razão; que é digna de veneração e de respeito; em seguida, torná-la amável, fazer com que os bons desejem que seja verdadeira, digna de veneração, pois conhece exatamente o homem; amável porque promete o verdadeiro bem"
(B. Pascal, pensieri, br. 187.)
O termo "religião" vem do latim religare, que significa "ligar, unir". De fato, a religião é um conjunto de mitos (relatos, textos sagrados, símbolos), ritos (preces, ações, sacrifícios) e normas (mandamentos, preceitos, regras) com o qual o homem exprime e realiza seus contatos com Deus. O fenômeno religioso é um fenômeno eminentemente humano; não pode ser encontrado nos demais seres vivos, apenas no homem. Esse é um fato indiscutível...
[...]
O fenômeno da religião, que abarca a humanidade toda, tanto em termos de espaço como de tempo, e não apenas este ou aquele grupo social de uma época histórica particular, é um fenômeno que assume proporções consideráveis. Os antropólogos e os etnólogos nos informam que o homem desenvolveu uma intensa atividade religiosa desde seu primeiro aparecimento no palco da história, e que as tribos e todas as populações, de qualquer nível cultural, cultivaram alguma forma de religião. Desde a idade paleolítica o homo religiosus está em pé, com os braços levantados. É o homem coroando as demais dimensões: trabalho, jogo, linguagem, ciência.
Bergson faz a seguinte observação: "Houve no passado e há ainda hoje, sociedades humanas que não têm nem ciência, nem arte, nem filosofia. Mas não existe nenhuma sociedade sem religião" (H. Bergson, Les deux sources de la morale et de la religion, cit., p. 105).
"Através da parte mais ilustre da história humana, em todos os séculos e em qualquer estágio da sociedade, a religião foi a força central unificadora da cultura, ela foi a guardiã da tradição, a preservadora da lei moral, educadora e mestra da sabedoria. [...] A religião é a chave da história. Não podemos compreender as estruturas íntimas de uma siciedade se não conhecermos bem a sua religião. Não podemos entender as suas conquistas culturais se não compreedermos as crenças religiosas que estão por trás delas. Em todas as idades, as primeiras elaborações criativas de uma cultura devem-se a uma inspiração religiosa e estão voltadas para um fim religioso. A religião está no limiar de todas as grandes literaturas do mundo" (Ch. Dawson, Religion and culture, Londres, 1948, pp. 49-50). [...].
Como diz Cícero, o homem é naturalmente religioso, porque a realidade que o circunda, com a sua força, com seu fascínio e com o seu terror, sugere a ele a existência de um Ser superior. E, segundo a bela definição de Max Scheler, o homo-religiosus é "o homem que interiormente participa de Deus e da sua força" (M. Scheler, L'eterno nell'uomo, cit., pp. 238-239).
[...]
Que o homem é um ser religioso trata-se de fato inegável, amplamente documentado pela história, pela antropologia cultural e pela arqueologia. Mas por que é um ser religioso? É justo que seja religioso? A religião pertence à natureza mesma do homem ou é simplesmente um expressão cultural da sua impotência e da sua imaturidade, destinada a desaparecer com o progresso da civilização?
A humanidade nasceu religiosa, assim como nasceu inteligente, criativa, livre, sociável, comunicativa, educável. A religiosidade é, pois, uma qualidade co-natural, inata; poder-se-ia dizer que está inscrita no próprio código genético do homem.
Em conclusão, para que exista religião é preciso que exista Deus. Sem Deus não poderia haver religião, como sem astros não haveria astronomia, sem plantas não haveria botânica e sem animais não haveria zoologia.
Para demonstrar a racionalidade do ato religioso é preciso provar que o seu objeto não é ilusório, mas real; em outras palavras, é preciso provar que Deus existe. A demonstração da existência de Deus é o único fundamento racional da religião. Se essa prova não existe, a religião reduz-se a cego fideísmo e romântico sentimentalismo.
[...]
A religião é a ascensão do homem para Deus, a progressiva aproximação de Deus, por parte do homem. Essa aproximação de Deus não é uma exigência imposta de fora, na forma de alguma lei ou decreto baixado pela vontade e pelo poder de Deus (como quando um escravo obedece ao seu senhor); é, antes, uma exigência inscrita no ser profundo do homem, feito à imagem e semelhança de Deus. É "a iconicidade divina" que faz do homem um ser naturalmente religioso.
Segundo a Sagrada Escritura, a essência do homem não está na racionalidade, na liberdade, na linguagem, na inventividade, na cultura, na religião etc., mas na sua capacidade de espelhar e de reproduzir a realidade de Deus, isto é, ser "um ícone" divino...

(Batista Mondin. Quem é Deus? pp. 48-51, 77-78, 398).




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